Nos últimos 20 minutos de “Sob as águas do Sena”, o filme ganha outro significado. A premissa de um “tubarão gigante nas águas de Paris” se transforma em algo maior, muito mais um filme-desastre do que um blockbuster descerebrado ao estilo “Megatubarão” – nada contra, inclusive me diverte bastante.
Dirigido por Xavier Gens (de séries como “Lupin” e “Gangs of London”), o filme sucesso na Netflix tem início com uma expedição de cientistas que acompanham tubarões em alto mar. Durante um mergulho, eles se deparam com uma surpresa – um dos tubarões que acompanhavam teria crescido bem mais do que o esperado e desenvolvido um comportamento agressivo, atípico para a espécie. A sequência inicial é puro terror, com o tubarão dizimando os cientistas até sobrar apenas Sophie (Bérénice Bejo, de “O Artista”).
Três anos depois, Sophie vive uma vida pacata em Paris até que uma jovem ativista a procura; aquele tubarão está sob as águas do rio Sena, no coração de Paris, à véspera de um evento de preparação para as Olimpíadas deste ano. Como em todo filme-desastre, as autoridades são alertadas, mas mostram pouco interesse, afinal, o evento custou milhões de euros e seu cancelamento seria péssimo para a imagem da prefeita da cidade.
“Sob as Águas do Sena” transcorre como um terror de realidade convencional. Mesmo sem ser brilhante, o filme faz bom uso, por exemplo, do segundo plano para criar tensão – movimentações na água, uma barbatana aparecendo ao fundo, uma sombra nas turvas águas do rio, tudo é usado como elemento de suspense. É curioso como o filme, após a sequência inicial, sem sutileza alguma, opta por esconder o tubarão no segundo ato. A escolha funciona, oferecendo uma quebra de ritmo à narrativa.
O filme de Xavier Gens é meio tosco, acredito que intencionalmente, e abraça o terror de baixo orçamento em alguns momentos, como quando mostra, por exemplo, o fundo do Sena com várias caveiras, como se fosse uma catacumba. Ao mesmo tempo, quando o faz, “Sob as Águas do Sena” é também um filme corajoso, que não poupa personagens e coloca a protagonista sempre sob ameaça, nos fazendo temer por ela.
O texto, nem sempre criativo, demanda uma boa vontade do espectador com algumas escolhas. O roteiro depende de decisões ruins de alguns personagens, principalmente dos mais jovens, para causar o impacto que almeja. Isso fica claro em uma sequência, mas ela apresenta uma escalada de violência absurda tão grande que o espectador até se esquece do que o levou até ali, buscando apenas desfrutar do que vê em tela.
É essa sequência, inclusive, que dá início ao caótico terceiro ato de “Sob as Águas do Sena”, quando o filme não apenas abraça o absurdo, como faz dele sua força motriz. É muito interessante como o texto prepara o espectador para esse mergulho no improvável desde o início, dando indícios do que está para acontecer – nada é absolutamente realista, mas não é isso que o espectador procura em um filme de tubarão assassino em uma das maiores cidades do mundo.
Ao final de “Sob as Águas do Sena”, o público está tão absorto que se torna difícil evitar uma sensação de “quero mais, quero muito mais!”. Felizmente, como os créditos – e o sucesso – dão a entender, haverá mais. O filme da Netflix, longe de ser brilhante, prova que é possível ser bagaceira, pop e inteligente ao mesmo tempo. É incrível? Não, absolutamente não, mas duvido que o espectador não termine o filme embasbacado, sem procurar se haverá ou não uma continuação.
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