As boas comédias românticas precisam de dois pilares para se sustentar: um texto divertido e confortável e química entre os protagonistas. “Ninguém Quer”, da Netflix, cumpre esses requisitos com sobra.
Em 10 episódios de cerca de 25 minutos cada, a série acompanha Joanne (Kristen Bell), a apresentadora de um podcast ao lado da irmã (que quase sempre acaba no tema sexo), e Noah (Adam Brody), um rabino bonitão recém-separado de sua noiva e com aspirações dentro de sua comunidade.
A união dos dois não é das mais improváveis, afinal são duas pessoas bonitas, com uma conhecida em comum e solteiras. É no desenvolvimento dessa relação que a série criada por Erin Foster a partir de sua própria experiência de relacionamento com um homem judeu fisga o espectador de imediato.
“Ninguém Quer” abusa das diferenças culturais de seus protagonistas, fazendo humor com elas e também transformando-as em conflitos. Com todo o ambiente da série estabelecido na relação de uma mulher agnóstica e um rabino, o texto se esforça para tratar tudo com leveza, sem pesar a mão em julgamentos de certo ou errado.
A série se sustenta mesmo é no carisma e na química de Bell e Brody, amigos na vida real e que já trabalharam juntos antes. Ajuda muito que ambos nos remetam a personagens anteriores, Joanne como uma versão mais light da Eleanor de “The Good Place” e Brody vivendo quase uma sequência de seu Seth Cohen, de “The OC”. Juntos, eles são sexies, engraçados e nos fazem crer naquela relação e, principalmente, que ela vale a pena.
“Ninguém Quer” pegar um filão de obra voltada para adultos millennials, que entendem as obrigações da maturidade, mas que se recusam a deixar que a sisudez da vida adulta conduza suas vidas. Tanto Bell quanto Brody têm 44 anos, já tendo há muito passado da adolescência na qual se tornaram famosos, e a série oferece ao público que se identificava com eles quando mais novo tenha um vislumbre da vida adulta, que, afinal, chega para todos.
Outro grande acerto é cercar o casal de protagonistas com bons personagens, principalmente Sasha (Timothy Simons, de “Veep”) e Morgan (Justine Lupe, de “Succession”). O primeiro é o irmão meio “desajustado” de Noah, enquanto Morgan é irmã de Joanne e sua parceira no podcast.
Mesmo pouco ousada em sua estrutura, seguindo todos os devidos passos das comédias românticas, “Ninguém Quer” é ágil. A série cria pequenos conflitos em meio ao grande conflito (o rabino namorando uma gentia) e os resolve em cada episódio, não dando a impressão de estar enrolando o público – na verdade, a construção até ajuda no desenvolvimento da tensão para o arco principal, pois os pequenos problemas são resolvidos, mas acrescentam à grande trama.
Há, claro, a utilização de estereótipos, principalmente o da família judia, mas eles colaboram para a ambientação pouco desafiadora, que não requer nada do público além de que ele assista à série, se divirta e se envolva com ela.
O texto busca referências em boas comédias românticas, mas sabe ser original. É muito interessante como, em determinados momentos, o texto caminhe para a vergonha alheia, mas se sai muito bem, com os personagens lidando com tudo com naturalidade, sem conflitos forçados ou exageros.
Com um episódio inicial impecável e uma temporada excelente, “Ninguém Quer” é uma ótima surpresa na Netflix. A série sabe aproveitar como poucas os seus protagonistas e entregar uma história de amor de certa forma complexa, com obstáculos, mas de fácil assimilação, com a qual a identificação é quase imediata.
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